Babel
Ainda fui a tempo de ver Babel no cinema, sempre que posso evito que o primeiro olhar sobre uma obra da sétima arte seja via dvd.
E devo dizer que apreciei este novo filme de Alejandro González Iñárritu, que se cose com as mesmas linhas narrativas do anterior, 21 Gramas; várias estórias, outra vez a fragmentação espacial.
Babel começa algures nas cordilheiras do Atlas, nas terras áridas habitadas pelos povos berberes. Temos uma carabina oferecida por um caçador japonês ao seu guia nessas paragens, que por sua vez a vende a um pastor. Este entrega a arma os filhos, para que protejam o rebanho de cabras dos chacais. Então dá-se o acontecimento unificador: os miúdos procuram quebrar a monotonia do tempo e da paisagem, alvejando os carros que passam ao longe na estrada; e nisso atingem um autocarro de turistas, ferindo uma americana, com o marido em viagem; em viagem de reatamento, talvez na esperança de que as agrestes montanhas do Norte de África pudessem resgatar a confiança perdida. Em risco de vida, numa região remota, a mulher é transportada para uma aldeia berbere, onde constava haver um médico (que mais tarde verificamos ser antes um veterinário).
Este casal americano tem dois filhos, que ficaram nos Estados Unidos ao cuidado de uma ama mexicana. Deslocamo-nos então para o México, para um casamento. E ama com as crianças americanas, loiras e imaculadas, no coração da pátria de Emiliano Zapata. A aventura mexicana vai desembocar na imigração, é uma história sem final feliz: a desafortunada ama acaba condenada à deportação pelos serviços de imigração americanos, quando do seu regresso pela noite dentro, finda a festa de casamento, aos EUA.
Mas Babel não fica apenas por estas geografias: somos levados para a grande metrópole japonesa, para seguir uma rapariga surda-muda, filha de um homem de negócios que é também o caçador a que atrás fizemos alusão. Eu aqui confesso o meu fascínio, sempre que se fala do Japão contemporâneo e lá me deixei-me seduzir pela personagem (a imoderada afirmação da sua sexualidade feminina) e a urbanidade de fundo.
O dispositivo narrativo é eficaz, o recurso à descontinuidade espacial (o tempo dos acontecimentos é mais ou menos o mesmo, mas as geografias vão-se alternando sucessivamente) restitui-nos o pulsar de um mundo unificado e globalizado. Um olhar sobre a globalização que não dispensa as contradições e que não esquece a política: do Japão, pináculo da sociedade de consumo, para a pobreza endémica do interior norte africano; da notícia da turista americana alvejada em Marrocos e dos fantasmas do terrorismo assim convocados; da violência da polícia marroquina que se abate sobre vidas simples, que não escapam às representações do nosso tempo; e, por fim, das injustiças associadas ao fenómeno da imigração.
Babel filma o nosso tempo; é honesto e frontal. Mas, evidentemente, tinha de ser o ódio de estimação dos críticos cá da praça.
E devo dizer que apreciei este novo filme de Alejandro González Iñárritu, que se cose com as mesmas linhas narrativas do anterior, 21 Gramas; várias estórias, outra vez a fragmentação espacial.
Babel começa algures nas cordilheiras do Atlas, nas terras áridas habitadas pelos povos berberes. Temos uma carabina oferecida por um caçador japonês ao seu guia nessas paragens, que por sua vez a vende a um pastor. Este entrega a arma os filhos, para que protejam o rebanho de cabras dos chacais. Então dá-se o acontecimento unificador: os miúdos procuram quebrar a monotonia do tempo e da paisagem, alvejando os carros que passam ao longe na estrada; e nisso atingem um autocarro de turistas, ferindo uma americana, com o marido em viagem; em viagem de reatamento, talvez na esperança de que as agrestes montanhas do Norte de África pudessem resgatar a confiança perdida. Em risco de vida, numa região remota, a mulher é transportada para uma aldeia berbere, onde constava haver um médico (que mais tarde verificamos ser antes um veterinário).
Este casal americano tem dois filhos, que ficaram nos Estados Unidos ao cuidado de uma ama mexicana. Deslocamo-nos então para o México, para um casamento. E ama com as crianças americanas, loiras e imaculadas, no coração da pátria de Emiliano Zapata. A aventura mexicana vai desembocar na imigração, é uma história sem final feliz: a desafortunada ama acaba condenada à deportação pelos serviços de imigração americanos, quando do seu regresso pela noite dentro, finda a festa de casamento, aos EUA.
Mas Babel não fica apenas por estas geografias: somos levados para a grande metrópole japonesa, para seguir uma rapariga surda-muda, filha de um homem de negócios que é também o caçador a que atrás fizemos alusão. Eu aqui confesso o meu fascínio, sempre que se fala do Japão contemporâneo e lá me deixei-me seduzir pela personagem (a imoderada afirmação da sua sexualidade feminina) e a urbanidade de fundo.
O dispositivo narrativo é eficaz, o recurso à descontinuidade espacial (o tempo dos acontecimentos é mais ou menos o mesmo, mas as geografias vão-se alternando sucessivamente) restitui-nos o pulsar de um mundo unificado e globalizado. Um olhar sobre a globalização que não dispensa as contradições e que não esquece a política: do Japão, pináculo da sociedade de consumo, para a pobreza endémica do interior norte africano; da notícia da turista americana alvejada em Marrocos e dos fantasmas do terrorismo assim convocados; da violência da polícia marroquina que se abate sobre vidas simples, que não escapam às representações do nosso tempo; e, por fim, das injustiças associadas ao fenómeno da imigração.
Babel filma o nosso tempo; é honesto e frontal. Mas, evidentemente, tinha de ser o ódio de estimação dos críticos cá da praça.