quarta-feira, abril 11, 2007

Uma licenciatura que virou bola de neve

Passou quase despercebida a promulgação do diploma da interrupção voluntária da gravidez, no turbilhão das notícias sobre os contornos da licenciatura de José Sócrates na Universidade Independente. E é pena. Porque ontem foi um dia importante para todos os que se bateram por esta nobre causa, entre os quais nunca é demais destacar o contributo do primeiro-ministro.
Mas o dia continuou a ser pautado por um caso que nunca imaginei que entre nós viesse a assumir tal repercussão. Acabou mesmo por se transformar numa bola de neve, depois de relatos de pressões protagonizadas por assessores do governo sobre os poucos, muito poucos, que na comunicação social tinham ousado fazer disto notícia. Ora, as pressões acabaram por ter o feito contrário, enchendo de brio os jornalistas. E de então para cá, todos competem para ver quem dá mais eco às incongruências e omissões que rodeiam o processo da licenciatura de José Sócrates na Independente, que para mim se resume à questão de saber se houve tratamento de favor no processo das equivalências. É claro que também não é muito normal que Sócrates tenha tido o mesmo docente a quatro das cinco cadeiras; e que esse mesmo docente tenha desempenhado cargos em governos PS, primeiro com Armando Vara, no tempo em que Sócrates era secretário de Estado, depois já com este na condição de primeiro-ministro, enquanto presidente do Instituto da Gestão Financeira e Patrimonial da Justiça. Parece ter havido uma estranha imbricação de interesses políticos e académicos, dito de outro modo, uma relação muito pouco recomendável.
Mesmo não dissipando todas as dúvidas (há aspectos que só os responsáveis da Independente poderão esclarecer cabalmente), poderia José Sócrates ter minimizado os danos se mais cedo tivesse prestado esclarecimentos. Mas só hoje à noite quebrará o silêncio.
Arrisca-se a ver maculada a imagem de rigor e exigência que tanto cultivou, ainda para mais se nos lembrarmos que para impor medidas impopulares não hesitou muitas vezes em lançar o anátema sobre determinadas classes profissionais (basta ver os casos do alegado absentismo dos professores ou as férias dos juízes). É que, para muitos dos seus adversários, o significado político deste episódio pode não ser despiciendo.