O primeiro-ministro José Sócrates visita Angola com uma comitiva que reúne a nata do empresariado português, quer dizer grosso modo, banqueiros e construtores civis.
A antiga colónia portuguesa cresce hoje a uma taxa superior a 20% ao ano e é aos olhos de muitos portugueses outra vez terra de sonho; promessa de um novo eldorado.
Ao longo da nossa história, sempre vivemos de costas voltadas para a Europa, as oportunidades de mudança sentíamos que estavam além-mar. Primeiro, a descoberta do caminho marítimo para a Índia e a rota especiarias ao nosso alcance, depois o ouro do Brasil. No século XX, eram as colónias africanas e Angola “a jóia da coroa”.
É um sentimento enraizado em muitos portugueses, que nem mesmo a euforia da entrada na União Europeia conseguiu dissipar. Por mais fundo estrutural que viesse de Bruxelas, os empresários não entreviam oportunidades de expansão e internacionalização. Limitaram-se tão-só a gerir o estado de coisas e a aguardar a vinda do futuro.
Perante Angola, a atitude da classe empresarial é em tudo distinta: o optimismo desenfreado, sentimento aliás comum à entourage do primeiro-ministro, a crença feita num futuro de expansão e internacionalização. Enfim, oportunidade é palavra que anda na boca do mundo.
A euforia é no entanto má conselheira e poderemos, no fim, não obter os ganhos que esperamos. Se a perspectiva é ir para Angola “rapidamente e em força” em busca de dinheiro fácil, creio que o saldo será negativo; nem portugueses nem angolanos beneficiarão com a prevalência de tal atitude.
Entre os angolanos há mesmo alguma desconfiança em relação ao empresário português, representação certamente assente em estereótipos mas também fundada na realidade presente. Atente-se neste exemplo que nos dá o escritor José Agualusa na sua crónica, de 26 de Março, na Pública :
Nas conversas, ao domingo, nos bares da ilha, os angolanos comparam preços. Alguém lembra que o Estádio dos Coqueiros foi reconstruído por uma empresa portuguesa por vinte milhões de dólares. Já o estádio do Interclube de Luanda, levantado de raiz por uma empresa chinesa, terá ficado em dois milhões e meio de dólares. O regime angolano confia na capacidade de trabalho dos chineses. A execução destas obras nos prazos previstos –apenas vinte meses, por exemplo, no caso do Caminho de Ferro de Benguela – talvez possa melhorar a imagem, muito degradada, do Presidente, José Eduardo dos Santos, e do seu partido, ainda a tempo das próximas eleições.
Lembra ainda a importância da cultura e da educação nas relações entre os dois países, vertentes esquecidas nesta visita de Sócrates.
Onde Portugal se pode distinguir da China, de Israel ou até mesmo da África do Sul, potência regional, é no campo da educação e da cultura.