Kontratempos
Já me tinham chegado ecos do Kontratempos, blog do Tiago Barbosa Ribeiro. Mas foi este post que me reteve, por causa das suas idiossincrasias; por aquilo que releva do seu autor.
O Tiago fala do conflito que assola o Líbano em termos muito hollywoodescos, a fazer lembrar aqueles filmes em que as personagens se limitam quase só uma representação grosseira do bem e do mal. Assim, o Hezbollah seria a personificação do mal, enquanto a Israel caberia representar o bem. E para conformar a ímpia realidade da guerra à pureza dos seus princípios ou juízos morais, afirma que Israel “não faz qualquer ataque deliberado a civis”. Extraordinário argumento. E assaz falacioso.
Vejamos então: quando um país alicerça a sua estratégia militar em bombardeamentos aéreos, sabe que provocará inevitavelmente inúmeras baixas civis, pelo que é irrelevante dizer que não o faz de forma deliberada.
É um pressuposto que os israelitas não poderiam certamente ignorar , ao enveredarem por uma tal estratégia, que aliás não tem produzido os resultados militares esperados; aparentemente, a máquina de guerra do Hezbollah não tem sido muito afectada, ao contrário das populações civis.
Em suma, considerando que os estrategos israelitas não procuraram atingir populações civis, poderíamos dizer que a morte destes é aqui consequência involuntária das suas acções, no caso concreto, o trágico bombardeamento de Qana.
Dito isto, é bom lembrar que no passado as forças armadas de Israel tomaram os civis como alvo, basta tão-só remeter o Tiago para os bombardeamentos de 1982, em Beirute, ou para os de 1996, no Sul do Líbano. Ou para o artigo Morality is not on our side, de Ze'ev Maoz no jornal HAARETZ. Mas eu penso que enunciados do Tiago são “à prova da realidade histórica”.
Outra asserção falaciosa é a de que “Israel lançou panfletos pedindo aos civis para abandonarem as suas casas”.
Tudo é simples à sombra desta lógica, Israel avisa que irá bombardear e os civis expeditamente abandonam as sua terras, transformadas numa espécie de arena onde se digladiarão as forças do Tsahal e as milícias do Hezbollah. De pouco importa que estradas, pontes e demais vias de comunicação tenham sido destruídas por acção do exército de Israel. Ou que seja uma decisão simples, para as pessoas, abandonarem tudo o que têm assim exposto ao roubo e à pilhagem. Ou que em tempo de guerra o custo das deslocações seja impossível de suportar para os que estão desprovidos de meios económicos. Ou que os velhos e os inválidos não se possam deslocar e que as famílias não os queiram deixar à sua sorte. Mas não. Para o Tiago, estas pessoas carregam a culpa de terem permanecido e não acatado o diktat de Israel. Deixam de ser civis para assumirem natureza do terrorista ou passarem a ser meros escudos humanos. Seria ridículo se não fosse trágico.
É mais um exemplo de como o maniqueísmo grassa, de desumanização do “outro”.
O mundo do Kontratempos é a preto e branco. Um mundo de escolhas simples, entre o bem o mal. Tudo é claro. Como naqueles filmes de Hollywood.
O Tiago fala do conflito que assola o Líbano em termos muito hollywoodescos, a fazer lembrar aqueles filmes em que as personagens se limitam quase só uma representação grosseira do bem e do mal. Assim, o Hezbollah seria a personificação do mal, enquanto a Israel caberia representar o bem. E para conformar a ímpia realidade da guerra à pureza dos seus princípios ou juízos morais, afirma que Israel “não faz qualquer ataque deliberado a civis”. Extraordinário argumento. E assaz falacioso.
Vejamos então: quando um país alicerça a sua estratégia militar em bombardeamentos aéreos, sabe que provocará inevitavelmente inúmeras baixas civis, pelo que é irrelevante dizer que não o faz de forma deliberada.
É um pressuposto que os israelitas não poderiam certamente ignorar , ao enveredarem por uma tal estratégia, que aliás não tem produzido os resultados militares esperados; aparentemente, a máquina de guerra do Hezbollah não tem sido muito afectada, ao contrário das populações civis.
Em suma, considerando que os estrategos israelitas não procuraram atingir populações civis, poderíamos dizer que a morte destes é aqui consequência involuntária das suas acções, no caso concreto, o trágico bombardeamento de Qana.
Dito isto, é bom lembrar que no passado as forças armadas de Israel tomaram os civis como alvo, basta tão-só remeter o Tiago para os bombardeamentos de 1982, em Beirute, ou para os de 1996, no Sul do Líbano. Ou para o artigo Morality is not on our side, de Ze'ev Maoz no jornal HAARETZ. Mas eu penso que enunciados do Tiago são “à prova da realidade histórica”.
Outra asserção falaciosa é a de que “Israel lançou panfletos pedindo aos civis para abandonarem as suas casas”.
Tudo é simples à sombra desta lógica, Israel avisa que irá bombardear e os civis expeditamente abandonam as sua terras, transformadas numa espécie de arena onde se digladiarão as forças do Tsahal e as milícias do Hezbollah. De pouco importa que estradas, pontes e demais vias de comunicação tenham sido destruídas por acção do exército de Israel. Ou que seja uma decisão simples, para as pessoas, abandonarem tudo o que têm assim exposto ao roubo e à pilhagem. Ou que em tempo de guerra o custo das deslocações seja impossível de suportar para os que estão desprovidos de meios económicos. Ou que os velhos e os inválidos não se possam deslocar e que as famílias não os queiram deixar à sua sorte. Mas não. Para o Tiago, estas pessoas carregam a culpa de terem permanecido e não acatado o diktat de Israel. Deixam de ser civis para assumirem natureza do terrorista ou passarem a ser meros escudos humanos. Seria ridículo se não fosse trágico.
É mais um exemplo de como o maniqueísmo grassa, de desumanização do “outro”.
O mundo do Kontratempos é a preto e branco. Um mundo de escolhas simples, entre o bem o mal. Tudo é claro. Como naqueles filmes de Hollywood.