O sonho palestiniano ameaçado
Devia ainda notar-se que o mundo árabe está em muitos maus lençóis. Todos os seus governantes sem excepção são tirânicos e anti-democráticos. Não há democracia: Os árabes estão a pagar o pior dos preços de tudo isso. Esse preço não está a ser pago pelos Estados Unidos. Está a ser cobrado aos árabes cuja situação geral – quer em termos de saúde ou educação, transportes ou meio ambiente – tem vindo a piorar inexoravelmente ao longo dos últimos anos, nunca de modo mais acelerado do que a partir do momento em que o processo de paz teve início, nos começos da década de 1990. E penso que tudo isto pode explicar porque é que a Palestina se tornou uma espécie de catalisador da opinião árabe a nível mundial. Nela está representada a injustiça do governante contra o governado – quer se trate dos israelitas que governam os palestinianos ou dos palestinianos que governam palestinianos, usando a Autoridade Palestiniana contra cidadãos palestinianos, em territórios ocupados por Israel… Edward Said, entrevistado por David Barsamian, 9 Novembro de 2000. In Cultura e Resistência.
As palavras de Edward Said não sofreram, infelizmente, a erosão do tempo. Ao invés, permanecem plenas de actualidade; na narração da triste sorte da maioria das nações árabes, mergulhadas no mau governo e no despotismo; no que já deixavam prenunciar, sobre a desgraça que entretanto se abateu sobre a Palestina, agora cindida em duas unidades político-territoriais. Oslo desembocou no desespero, e o sonho da autodeterminação palestiniana ameaça ser submergido pela luta sectária.
Evidentemente que a estabilidade não podia brotar de um tal clima político, cujo resultado mais imediato foi o que se viu em Gaza, de onde quase desapareceram os vestígios da Fatah e o Hamas é hoje lei (ao que parece, respira-se agora, nessa depauperada faixa costeira, mais segurança, a avaliar por uma reportagem muito interessante do jornal PÚBLICO). Preparam-se os putativos líderes do Ocidente e da Comunidade Internacional para criar um cordão sanitário em torno de Gaza e levantar as sanções à Cisjordânia, sob controlo da Fatah. É persistir no erro, é a receita para o desastre!
