quarta-feira, junho 03, 2009

Império

Em Império, Ryzard Kapuciski percorre as paragens remotas do que então era a União Soviética.
O livro está dividido em três viagens ou, melhor dizendo, duas, porque na primeira é o Império que vai ao encontro de Kapucinski ainda miúdo, em Pinsk, a sua terra natal, então ocupada pelos soldados do Exército Vermelho. Estávamos no ano de 1939.
Depois, percorremos as repúblicas da Ásia e do Sul do Império, não fosse o interesse primordial do escritor e jornalista a sorte dos povos colonizados. É o segundo período do livro, entre 1958 e 1967, em que Kaupucinski nos revela o que está para lá da ideologia. As culturas e tradições, breve, fragmentos do quotidiano dos povos que habitavam as terras da União soviética.
Por fim, o ocaso do Império, os últimos anos da Perestroika, entre 1989-91. Não são, porém, os meandros da política que ocupam Kapuscinki, mas sim as pessoas comuns. Captar as estórias destas e assim dar-nos um fresco do Império, eis todo o talento de repórter que era marca de Ryxard Kapuscinki. Esta imensa viagem termina onde começou: em Pinski,. Já não na Polónia de Kapucinski, mas na Bielorrússia.


Wanik Santrian leva-me pelos sítios mais recônditos de Jerevan, porque foi precisamente o que lhe pedi: que nos afastássemos dos caminhos muito frequentados. Assim, chegámos ao pátio de Benik Petrusian. O pátio, fechado nos quatro lados pelas paredes das casas circundantes, é o lugar da exposição permanente dos trabalhos de Benik. Benik tem vinte e oito anos, formou-se na Academia de Belas-Artes de Jerevan e é escultor. Pequeno e tímido, vive no seu acanhado estúdio, cuja porta dá, precisamente, para o pátio da exposição. Penduradas nas paredes estão umas magníficas cruzes de pedra, chamadas Khatchkars, que, no seu tempo, os arménios talhavam nas rochas. Os Khatchkars encontram-se ao comprimento e largura da Arménia, porque foram o símbolo da existência daquele povo, marcavam as fronteiras e , por vezes, indicavam o caminho.
(Jerevan – Arménia 1967).


Desde jovem, explica gritando e desatando num pranto, tive que trabalhar num serralharia. Toda a vida trabalhei o ferro.
[…]
Pequena e magra, Anna Andreievna, mulher de cabelo prateado e rosto marcado e pálido, agita, com raiva, diante de mim uns poderosos punhos de aço, dignos de qualquer torneiro que tenha trabalhado o ferro toda a vida.
E, no entanto, mesmo no meio da sua maldita sorte, acaba por encontrar um facho de luz, uma migalha de satisfação humana, pois passado um momento acrescenta:
Puseram-me mãos de homem, fizeram-me estalinista, mas nunca me fizeram comunista!
(Novogorod – Rússia 1990).