quinta-feira, junho 30, 2005

O Bem

Às vezes, somos invadidos por um sentimento de nobreza, por uma necessidade absoluta de fazer o bem, só que…


O demoníaco assume por vezes a aparência do bem ou ganha mesmo completamente corpo nele. Se eu não em apercebo disso, estou, naturalmente, em desvantagem, pois este bem é mais sedutor do que o autêntico. Mas que me acontece quando eu me apercebo disso? Quando, numa batida aos demónios, sou acossado em direcção ao bem? Quando, transformado em objecto repugnante, vou de roldão, espicaçado e encurralado por agulhas que me picam? Quando as garras visíveis do bem se atiram a mim? Recuo um passo e mergulho, fraco e triste, no mal, que esteve todo o tempo atrás de mim à espera da minha decisão.

Do Espólio, Franz Kafka.