Alice
Enfim fui ver Alice.
Um belo filme. Parte de uma ideia simples, o desaparecimento de uma filha, em suma, a perda.
Mário, o protagonista, tem a sua vida presa a esse acontecimento. Todos os dias repete, numa espécie de ritual religioso, o percurso que fez naquele fatídico dia em que a filha desapareceu, num esforço desesperado para resgatar a normalidade quotidiana, que fora brutalmente interrompida pelo acontecimento. È a recusa da realidade ou a insubmissão a esta.
Depois, coloca câmaras de filmar em vários pontos da cidade, fazendo uso de uma rede de solidariedade e de conhecimentos tecida no anonimato da metrópole. Através destas imagens, confrontamo-nos com uma Lisboa fria e baça, habitada por gente distante e anónima. Mesmo assim, é difícil não sermos seduzidos por essas imagens em tons de azul esverdeado, ou pelos sons agrestes do metro e dos comboios suburbanos. A forma como é filmada a urbe fez-me lembrar algum cinema oriental (lembro-me de “O Rio”, deTsai Ming-liang, cineasta de Taiwan ).
Mário vive da dissecação deste mundo de imagens, mas é como se não existisse fora delas. São elas que dão sentido à sua existência e que melhor exprimem a desesperada procura de um sinal da filha desaparecida. Sim, porque aqui trata-se acima de tudo de filmar a busca obsessiva que molda uma existência marcada pela dor. Foi o que tão bem soube fazer o realizador Marco Martins.
Também muito bela a música de Bernardo Sassetti.
Recomendo este filme à corte neoliberal da blogosfera.