quinta-feira, dezembro 22, 2005

Ayaan Hirsi Ali

Example
Ayaan Hirsi Ali é um exemplo de rara coragem e humanismo, de uma vida dedicada ao ideal dos direitos humanos, da recusa das tradições que aviltam a dignidade dos indivíduos e cerceiam a universal aspiração à liberdade.
Desenvolve uma luta solitária pela defesa dos direitos das mulheres muçulmanas na Holanda, denunciando práticas como a mutilação genital, os crimes de honra ou os casamentos forçados.
Nascida na Somália, em 1969, Hirsi foi também submetida à mutilação genital quando tinha então cinco anos de idade. Provém de uma família vítima das perseguições políticas no tempo do regime de Siad Barre. O seu pai esteve sete anos preso e depois conheceu o exílio na Arábia Saudita, Marrocos e por fim no Quénia, onde Hirsi fez a escola secundária num colégio para raparigas muçulmanas.
Aos 22 anos, estava destinada ao casamento forçado com um membro do seu clã emigrado no Canadá. Mas Hirsi Ali recusou o destino imposto pela tradição e buscou asilo político na Holanda, onde conseguiu uma autorização de permanência. Aí fez a aprendizagem da língua holandesa, sobreviveu nos empregos mal pagos da imigração (foi por exemplo empregada de limpeza) e ainda arranjou tempo para uma licenciatura em Ciência Política.
Cedo percebeu a intolerância que se insinuava no modelo multiculturalista das tulipas, fundado separação das comunidades, na visão (culturalista) de que os comportamentos, as atitudes e crenças são determinados pela cultura de uma dada comunidade. Os indivíduos encerrados na comunidade de origem, numa espécie de apartheid, ficavam submetidos a tradições monolíticas, fora da cidadania (já em tempos escrevi sobre o mesmo assunto).
Foi contra isso que se rebelou Hirsi Ali, alertando a sociedade holandesa para os abusos de que eram vítimas as mulheres muçulmanas, privadas do direito de escolha. Da escolhas simples, como sair com amigos ou vestir determinada roupa, até à liberdade de completar os estudos ou escolher o parceiro para a vida.
Deparou com a indiferença de uns (quando denunciava casos de violência familiar a polícia respondia-lhe que nada podia fazer) e o ódio de outros, os fundamentalistas e as associações dos direitos das minorias reféns dos dogmas multiculturalistas.
Deputada pelo partido liberal (antes passou pelo partido trabalhista, mas aí não lhe permitiram desenvolver o trabalho ao qual consagrou a sua vida), foi responsável por medidas legislativas de combate à violência doméstica, no seio das quais os polícias recebem formação para lidar com os chamados “crimes de honra”; alargou a rede de refúgio para as mulheres , bem como a segurança; lutou por uma escola multiétnica e contra o ensino da segregação e da intolerância religiosa (dificultou o acesso de tais escolas aos apoios estatais).
Pela sua acção política pagou preço elevado, a limitação da sua própria liberdade por força das ameaças de morte a que tem estado sujeita por parte dos islamistas. À semelhança de Salman Rushie. Mas fê-lo em nome daquilo que de mais nobre há no homem : a liberdade.
Termino com uns versos de Rudyard Kipling que resumem bem o que está em causa :
'Oh, East is East and West is West
and never the twain shall meet,
till Earth and Sky stand presently
at God's great Judgment's seat.'

'But there is neither East nor West
Border nor breed nor birth
when two strong men stand face to face,
tho' they come from the end of the earth'
Também Edward. Said, na sua obra “ O Orientalismo”, nos dizia que Oriente e Ocidente são meras construções.