terça-feira, abril 18, 2006

Marx e a crítica do Estado

Compreende-se imediatamente que num país como a França, onde o poder executivo dispõe de um poder de um exército de funcionários de mais de meio milhão de indivíduos e tem portanto constantemente sob a sua dependência mais incondicional uma massa imensa de interesses e existências, onde o Estado manieta, controla e regulamenta, vigia e tutela a sociedade civil, desde as suas manifestações mais amplas de vida até às suas vibrações mais insignificantes, desde as suas modalidades mais gerais de existência até à existência privada dos indivíduos, onde este corpo parasitário adquire, pela mais extraordinária centralização, uma omnipresença, uma omnisciência, uma capacidade acelerada de movimento e uma elasticidade que só encontram correspondência desamparada, na disformidade incoerente do corpo social, compreende-se que em semelhante país, ao perder a possibilidade de dispor de postos ministeriais, a Assembleia nacional perdia toda a influência, se ao mesmo tempo não simplificasse a administração do Estado, não reduzisse o mais possível o exército de funcionários e finalmente não deixasse a sociedade civil [bürgerliche Gesellschaft] e a opinião pública criar os seus órgãos próprios, independentes do poder do governo. Mas, o interesse material da burguesia francesa está precisamente entretecido do modo mais íntimo com a conservação dessa extensa e ramificadíssima máquina do Estado. Coloca aqui a sua população excedente e completa sob a forma de vencimento do Estado o que não pode embolsar sob a forma de lucros, juros e rendas e honorários.
Karl Marx, in O 18 de Brumário de Louis Bonaparte
Nesta passagem do 18 de Brumário, encontramos um Marx ferozmente crítico da burocracia estatal e fazendo a defesa da sociedade civil.
É importante, à esquerda, um olhar despido de preconceitos sobre o Estado.
Toda a extensão do Estado não é necessariamente boa nem se traduz em benefícios sociais para as populações, acabando ao invés por cercear a sua energia criadora. Foi esse o logro das sociedades do leste do socialismo real, mas que ainda hoje assola muitas das correntes que, à esquerda, procuram resistir à hegemonia do pensamento liberal.
Urge pois colocar o indivíduo no centro do debate político, fazer com que este deixe de ser monopólio discursivo da direita liberal