segunda-feira, janeiro 08, 2007

Pergunta e dúvidas - II

A resposta a dar à pergunta "Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas primeiras 10 semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?" continua suscitar-me mais dúvidas que certezas.
Se por um lado sou sensível ao argumento da privacidade das escolhas morais de cada um, também sou sensível ao argumento de que elas poderão ter implicações no ordenamento jurídico que rege (bem ou mal) a todos os portugueses. Se por um lado, baseando-me tanto na fé (que me falta na minha relação com Deus) como na ciência, atríbuo ao feto a condição humana e com isso o direito a ter a sua vida defendida pelos outros membros da sociedade (dada a sua impotência para prover a tal), já sinto graves constrangimentos em aceitar impôr restrições às opções de ética de outros que não pensam ou sentem o mesmo que eu. Há um outro argumento, recorrente aliás, que diz que no corpo de cada mulher deve mandar ela. Completamente de acordo (mesmo no que diz respeito ao comércio sexual). Já não consigo compreender que se trate o feto como um invasor dos seus direitos de propriedade - não é ele uma consequência do exercício desse direito a dispôr do próprio corpo?
Inesperada consequência, não desejada consequência? Bom, creio ser facto conhecido de todos os que têm idade mental correspondente à sua idade física e que não sofram de qualquer deficiência impeditiva de tal descernimento, que a vida humana é gerada pelo sexo entre mulheres e homens. Não consigo ver nada de inesperado numa gravidez.

Que fique bem claro: eu sou contra o aborto.
Responderão, "Também não conheço que ninguém que seja a seu favor ou o incentive".
O que quero dizer é que sou contra o aborto como escolha para remediar uma má escolha de parceiro ou a falta de cuidados anti-concepcionais. Esta última então, nos dias que correm, com preservativos disponíveis em todas as mercearias e bombas de gasolina, com todas as campanhas públicas e privadas de disseminação do uso, é absolutamente indefensável como argumento desculpabilizador do recurso à IVG. O que quero dizer é que sou contra o aborto, porque a falta de responsabilidade na vida sexual dos pais não deve causar o fim de uma vida humana (nem quando a consideremos potencial). Porque um preservativo que se rompe não dá origem a nada inesperado - houve sexo, pode haver gravidez.
Remeter-me à leitura literal da pergunta facilitar-me-ia a resposta.
Não elimina no entanto todas as perguntas e dúvidas que tenho.

Mais uma: o que acontecerá, caso vença o SIM, àquelas mulheres que continuarem a recorrer às parteiras ("fazedoras de anjos")?
Quantas daquelas mulheres que engravidam e envergonhadamente abortam - quando o marido não pode ser o pai, por serem menores, por terem uma imagem pública a manter... - irão continuar a preferir o secretismo do muitos sítios que não são "estabelecimento de saúde legalmente autorizados"?
Irão ser presas e julgadas? A lei irá ser mudada ou não? Serão tratadas de maneira diferente das que se dirigiram a um hospital da rede estatal só porque optaram por praticar o mesmo acto - o aborto - entregando-se aos cuidados de não licenciados em medicina?
Sejamos coerentes: os adeptos do Sim, da despenalização do aborto (até às 10, 12, 9... semanas), devem também pugnar para que nenhuma mulher seja penalizada pela escolha do sítio onde praticar a IVG.