terça-feira, abril 01, 2008

Sobre o Estatuto do Aluno

De que tanto se fala, e ainda com o vídeo em pano de fundo, pois repetido ad nauseam pela televisão que é a nossa, a que dizem que fazemos por merecer, lá fui ao sítio do Ministério da Educação ler mais esta peça de fino recorte; e cuja retórica discursiva mais parece saída das páginas do 1984, pois é de novilíngua de que se trata.
Confesso que só a custo cheguei ao fim do documento legislativo que consagra os direitos e deveres do aluno, em subtexto de assimetria, evidentemente.
Nele confluem os formalismos de que padece o nosso sistema judicial (há até recurso hierárquico e autos para os alunos), bem como o rosário de boas intenções que, lamentavelmente, parece dominar o pensamento dos teóricos das ciências da educação… Tudo feito por gente que vive apartada da escola pública; do tempo desta.
Por tudo isso, só me resta reproduzir o que o António Barreto escreveu, no PÚBLICO de ontem:

O ESTATUTO cria um regime disciplinar em tudo semelhante ao que vigora, por exemplo, para a Administração Pública ou para as relações entre Administração e cidadãos. Pior ainda, é criado um regime disciplinar e sancionatório decalcado sobre os sistemas e os processos judiciais. Os autores deste estatuto revelam uma total e absoluta ignorância do que se passa nas escolas, do que são as escolas. Oscilando entre a burocracia, a teoria integradora das ciências de educação, a ideia de que existe uma democracia na sala de aula e a convicção de que a disciplina é um mal, os legisladores do ministério da educação (deste ministério e dos anteriores) produziram uma monstruosidade: senil na concepção burocrática, administrativa e judicial; adolescente na ideologia; infantil na ambição.

(...)

O processo educativo, essencialmente humano e pessoal, é transformado num processo “científico”, “técnico”, desumanizado, burocrático e administrativo que dissolve a autoridade e esbate as responsabilidades. Se for lido com atenção, este estatuto revela que a sua principal inspiração é a desconfiança dos professores. Quem fez este estatuto tinha uma única ideia na cabeça: é preciso defender os alunos dos professores que os podem agredir e oprimir. Mesmo que nada resolva, a sua revogação é um gesto de saúde mental pública.

António Barreto, in PÚBLICO, 30 de Março de 07.