segunda-feira, julho 28, 2008
quarta-feira, julho 23, 2008
Radovan Karadzic
«Les Serbes peuvent vivre sans pain, mais pas sans État»
Do berço camponês à cosmopolita Sarajevo, onde se formou em medicina na especialidade de psiquiatria (a paranóia e a depressão eram suas áreas, ao que consta) .
Forjou a sua mundovisão nas lendas e mitos que dão corpo à gesta do povo sérvio, perpetuadas pela tradição oral camponesa. Fez poesia inspirada nelas. Nunca se sentiu parte de Sarajevo, mas amava a sua vida boémia e literata.
Parece ter tomado contacto com a ideologia nacional da pureza étnica através de um colega de profissão, Jovan Raskovic, um fervoroso nacionalista que, nos fim dos anos oitenta, utilizava a televisão para exaltar as virtudes do povo sérvio e lançar invectivas contra muçulmanos (padeciam de frustração anal) e croatas (efeminados pela religião Católica). Imaginamo-lo à imagem desses tele-evangelistas propagadores do ódio ao "outro". A História também é feita de homens assim. Homens cultos, civilizados, mas ao serviço das ideologias do ódio e da intolerância étnica/racial.
Líder implacável dos sérvios bónios, Rodovan Karadzic é indissociável da tragédia que assolou a então República Bósnia da Federação Jugoslava. Mas, convém lembrar, não esteve só. Que nesses anos de guerra civil contou com o apoio esmagador dos sérvios bósnios, muitos dos quais se dedicaram com zelo às operações de purificação étnica, vulgo, deportação, tortura e execução.
Karadzic, sobre quem impendia há vários anos um mandado de captura, foi finalmente detido e tudo leva a crer que não escapará ao braço da justiça internacional. Será julgado por genocídio e crimes contra a Humanidade.
Nas duas Sérvias de hoje, poucos saíram em sua defesa. Karadzic tornou-se descartável, de há muito um grão na engrenagem da adesão da República da Sérvia à União Europeia. Os sérvios entre a indiferença e o esquecimento, longe da reflexão crítica sobre os (trágicos) eventos do passado recente. Nisso não muito diferentes de outros povos.
PS. Evidentemente, há outros responsáveis da tragédia Bósnia, a saber, muçulmanos e croatas, mas este Tribunal Penal Internacional parece reger-se pela obsessão sérvia.
segunda-feira, julho 21, 2008
O Especialista
O especialista é útil apenas quando a sua especialidade é tam restricta que não tem importância. Pode haver bons especialistas de pregar pregos; não pode haver bons especialistas de construcção de civilizações. Há muitos bons cavadores e nenhum bom psychiatra.
O especialista é um homem que tem a opinião dos outros, embora sobre um só assumpto. O especialista é incapaz de iniciativa. Por isso os especialistas são muitos e felizes.
Álvaro de Campos
quinta-feira, julho 17, 2008
A Quinta da Fonte e os especialistas
Quem sai de um bairro de barracas para ser realojado em casas da habitação especial tem uma expectativa. "A mudança é vista como a possibilidade de upgrade social", diz Fonseca Ferreira, presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento da Região de Lisboa e Vale do Tejo. Contudo, "basta andar pelos arredores de Lisboa para distinguirmos os bairros sociais do resto; distinguimo-los pela arquitectura, pelo volume dos edifícios, pelo urbanismo, há uma marca social", com o estigma que isso acarreta. E quaisquer expectativas de upgrade acabam por sair frustradas, diz. Na Suécia ou na França, este tipo de distinção deixou de existir há anos. "Em Portugal continuamos a apostar numa arquitectura diferenciada das zonas que rodeiam os bairros." É um erro. Há excepções: "Na Alta de Lisboa está a apostar-se numa habitação social diferente, os prédios de habitação social são iguais aos outros."
Excerto de um artigo do PÚBLICO, 17-07-08
Detenho-me nas palavras de Fonseca Ferreira, presidente da Comissão de Coordenação de Lisboa e Vale do Tejo, não pela sua originalidade, longe, muito longe disso, mas pelo reprodução ad nauseam da tese de que basta ter bom urbanismo para os problemas se dissiparem.
É assim, sempre que se fala de habitação social. O que normalmente acontece pelas piores razões, como é agora o caso do Bairro da Quinta da Fonte, em Loures. E lá vem a velha cantiga de que lá fora é que é! A França, a Suécia...Interrogo-me se o presidente da CCDRLVT lê a imprensa on-line lá de fora, que não raro nos brinda com acontecimentos bem piores do que os ocorridos na Quinta da Fonte. E nem o admirável mundo nórdico da habitação social foge à regra. Portugal está longe de ser uma triste excepção, em matéria de comportamento disruptivos e de conflitualidade nos chamados bairros socais. E os níveis de violência urbana até são aqui bem menores do que noutras paragens dessa próspera Europa social.
Eric Hobsbawm escrevia, na Era dos Extremos, que as sociedades europeia e norte-americana não encontravam forma de lidar com populações empobrecidas e desenraizadas, em resultado do fenómeno mais geral de decomposição da classe operária. Ele via nisso um (triste) traço das nossas civilizações. Mas Hobsbawan é um historiador, não um desses especialistas…
A profissão de fé nas virtudes do urbanismo, capaz de transformar o pior dos bandidos num pacífico cidadão cumpridor das suas obrigações fiscais, está assaz disseminada. Dos especialistas aos profissionais da imprensa, passando pelo indígena luso/treinador de bancada, esta gente acredita que o urbanismo muda o comportamento humano! É o velho subtexto de engenharia social que só pode desembocar em equívocos. Eu aconselharia alguma modéstia a essa legião voluntarista de críticos.
Afirmar que os moradores dos bairros de habitação social não têm todos o mesmo comportamento, que este é diverso e variável (à semelhança do que sucede em qualquer outro bairro do país) já seria um começo. É que para estigmatizar populações não há nada como o discurso dos especialistas.
Troca desigual
Não sei se é recomeço, mas senti-me impelido a dizer duas ou três coisas sobre a troca, de prisioneiros e dos restos mortais de soldados e combatentes, entre Israel e a Milícia Hezbollah.
Creio que ela constitui o epílogo da segunda guerra do Líbano. Uma guerra sem glória travada pelo exército israelita, que não resgatou com vida os soldados Ehud Goldwasser e Eldad Regev, raptados pela milícia xiita libanesa, nem destruiu a infra-estrutura militar desta última, que reemergiu mais forte, a ponto de hoje pôr em causa os frágeis equilíbrios políticos, étnicos, da sociedade libanesa.
Mesmo não se tratando de um acto inédito, a troca de prisioneiros por restos mortais de soldados causa dano político a Israel, atendendo ao passado recente, `à guerra travada em solo libanês.
Israel entregou prisioneiros libaneses, gente célebre como Samir Kuntar, e em troca recebeu os corpos dos soldados Ehud Goldwasser e Eldad Regev. Trocou vivos por mortos. Para contentamento do Hezbollah